Será que o condomínio é o primeiro credor ou os valores pertencem a outros credores?
Tópicos
01 - O leilão do imóvel:
Em razão da inadimplência.
O leilão judicial é uma forma de aquisição de bens antecedidos de processos judiciais, de nível municipal, estadual ou federal, de ações variadas, como criminais, fiscais, trabalhistas, dívidas, entre outros. Esses leilões são realizados como atos oficiais determinados pelo juiz e objetivam a venda de bens para quitar dívidas com os credores. O inicio se dá com a ação judicial movida pelo credor contra o devedor, que, após a condenação, pode acarretar a penhora dos bens (ato de apreender e guardar judicialmente os bens do devedor para garantir o pagamento da dívida). Após a penhora, os bens são avaliados por um oficial de justiça ou perito nomeado pelo juiz. O leilão judicial é realizado online e os lances são feitos pela internet, através de uma plataforma de leilões autorizada pelo tribunal. O arrematante é a pessoa que oferece o maior lance pelo bem e, após a arrematação, ele deve efetuar o pagamento conforme estabelecido no edital que, pode ser feito à vista ou em parcelas, com uma entrada e o saldo em prestações.
02 - A arrematação:
Direito de preferência.
Arrematar é a venda judicial quando feita em leilão. O jurista Moacyr Amaral Santos define a arrematação como o “ato de transferência coacta dos bens penhorados, mediante o recebimento do respectivo preço em dinheiro, para satisfação do direito do credor”. Em palavras mais simples, a arrematação refere-se ao momento em que o bem é vendido para um participante em leilão.
Será lavrado o auto de arrematação ou carta de arrematação (assinado pelo juiz, arrematante e pelo leiloeiro). No auto estarão descritos todas as informações do bem, como valores, formas de pagamento e comissão do leiloeiro. Após a assinatura de todas as partes, a venda é considerada irreversível, não podendo mais ser cancelada.
Em seguida, depois do pagamento, o arrematante terá que fazer a transferência da propriedade. O comprador vai assinar a escritura de compra e venda e ir até um cartório para registro e matrícula do imóvel adquirido. Com tudo certo e documentos em mãos, o arrematante poderá se imitir na posse.
O direito de preferência é a possibilidade do ex-proprietário recomprar seu imóvel pelo valor total da dívida e das despesas. Para exercer o direito de preferência, precisa formalizar por escrito junto à empresa leiloeira com antecedência, antes do encerramento do leilão, solicitando o valor total devido e os dados para pagamento. O pagamento deve ser realizado antes do encerramento do leilão.
O Novo Código de Processo Civil previu ação autônoma, que não terá o força para desfazer a arrematação. Após a expedição da carta de arrematação, não será mais admitida a discussão da arrematação dentro do processo executivo. Eventual vício terá de ser arguido em ação autônoma.
O Estado preserva a regularidade das alienações judiciais, não podendo o arrematante, em relação ao bem arrematado, ficar à mercê do resultado dos embargos do devedor ou pior, de interminável ação autônoma em que se discute a invalidade da arrematação, interessando-lhe adquirir o bem livre e desembaraçado, e dar-lhe a destinação que lhe aprouver.
03 - O pagamento:
Entrada de dinheiro.
De acordo com a norma do artigo 1.336, inciso I, e §1º., do Código Civil, é dever do condômino contribuir para as despesas do condomínio na proporção de suas frações ideais. De outro lado, a natureza das cotas condominiais é propter rem decorrente da propriedade do imóvel. A origem do débito é a inadimplência de morador durante lapso considerável de tempo, que não honrou os débitos condominiais. Considerando que a existência de recursos disponíveis para o pagamento da dívida com a praça realizada, se mostra justo e razoável que os recursos depositados em Juízo, provenientes do leilão judicial, venham a crédito.
Os credores: quem recebe os valores?
Pode, à primeira vista, parecer estranha a colocação de que à reunião assemblear é defeso deliberar sobre coisa de propriedade alheia. Mas nesse contexto, se justifica e, certamente, isto já ocorreu e continua a acontecer, sem qualquer reflexão. Não é difícil de se encontrar em condomínio, caso em que há alguma unidade habitacional inadimplente, que assim permanece por largo tempo, acarretando a divisão (artigo 1.336, inciso I, CCB) das despesas mensais desta respectiva unidade às demais que integram o conjunto e que pagam pontualmente as taxas condominiais.
Começa a se desenhar a divisão obrigatória de despesas aos demais condôminos (artigo 1.336, inciso I, CCB), também em razão de que o condomínio tem que quitar suas obrigações mensais. Nessa suposta situação, a unidade devedora permanece durante muito tempo sem pagar as despesas condominiais mensais e, depois de longa jornada, as dívidas pendentes são quitadas. Daí surgem as dúvidas sobre como esse dinheiro passará a integrar o condomínio. Cabe primeiro dizer que o valor recebido, nesse caso específico, tem como origem as despesas ordinárias de condomínio e, cujo patrocínio saiu dos bolsos das demais unidades integrantes, via de seus condôminos; portanto, quem compôs a dívida foram os moradores das demais unidades habitacionais.
Esse é o primeiro ponto. Em se tratando de condomínio há um processo orçamentário, que se utiliza de lógica para aferir o custo (inclusive a taxa, regulamentada pela convenção de condomínio geralmente pela divisão da fração ideal e, segundo a obrigação do artigo 1.350, CCB). Assim, as despesas mensais condominiais são compostas, basicamente (aqui não se trata de afirmação fechada), na formação precificada, por todas as havidas para o funcionamento e pagamento de prestadores de serviços, funcionários, compra de materiais, contas de consumo e outras.
Registre-se que não é só dívida, existindo também uma reserva (determinada pela convenção), que existe para um fim específico, podendo ser liberada pela assembleia para cobrir justamente a inadimplência, ainda que momentânea (por exemplo, de venda, de revenda, de contrato de prestação de serviço, de aquisição de produtos, mercadorias, serviços, utilidades, e outras). Pois bem. Cientes estamos, portanto, de que os condôminos adimplentes custearam as despesas não pagas e relativas à unidade habitacional devedora, num verdadeiro empréstimo.
O problema tem início quando há o retorno dos valores de determinada unidade inadimplente, ao quitar totalmente a dívida que lhe pertence. Vêm as dúvidas: a quem pertencem os valores recebidos nessa condição: ao condomínio ou aos condôminos adimplentes? Como anteriormente ficou claro, houve um custeio pelos condôminos adimplentes relativo à composição da dívida daquela unidade inadimplente, já que, como todos sabemos, toda receita a crédito para o condomínio é paga pelos condôminos.
Desta forma, nada mais correto do que os valores retornarem para quem os custeou, o que revela que esses valores recebidos da unidade inadimplente, não pertencem ao condomínio, e, via de consequência, estão vedados para a utilização pelo condomínio sem que ocorra a deliberação pela assembleia, podendo até, em tese, configurar crime de dação de pagamento de coisa alheia.
Firmado, fica, pois, o entendimento de que a gestão desses valores recebidos, tem que ocorrer pela via da deliberação da assembleia, regularmente reunida para este fim específico. Ademais, note-se que o condomínio não pode receber ou muito menos deliberar duas vezes sobre o mesmo valor, lembrando que se tratam de valores para compor as despesas ordinárias mensais que já foi objeto de anterior reunião e deliberação assemblear.
Surge neste ponto a obrigação ‘propter rem’, ou própria da coisa, de caráter imperativo a incidir sobre o adimplente, sem conotação de ajuda ao inadimplente ou ao condomínio.
Mas sim, para compor aquelas despesas naquele momento, no qual falta dinheiro em caixa para pagamento das contas ordinárias.
Desta forma, se caracteriza o pagamento coercitivo (artigo 1.336, inciso I, CCB) pelo condômino adimplente. De outro lado desta questão, temos a assembléia anual, onde os condôminos se reunirão.
E votarão o orçamento, estabelecendo qual o valor total a ser arrecado mensalmente pelo condomínio (artigo 1.350, CCB):
- Convocará o síndico, anualmente, reunião da assembléia dos condôminos, na forma prevista na convenção, a fim de aprovar o orçamento das despesas, as contribuições dos condôminos e a prestação de contas, e eventualmente eleger-lhe o substituto e alterar o regimento interno.
Havendo inadimplência de determinado condômino, os demais moradores serão obrigados a custear os valores não pagos, e o farão por meio do rateio entre os próprios, relativamente ao total não pago e emprestá-lo ao condomínio para que este componha seu caixa e tenha os recursos para pagamento das despesas. Deixe-se claro que não há qualquer erro de procedimento do síndico quando um condômino se torna inadimplente. Traduzindo: quando, por lei (artigos 1.336, inciso I e 1.334, inciso I, ambos do CCB) e pela respectiva convenção condominial aos adimplentes são atribuídas as despesas oriundas da quota parte daquela unidade que não efetuou ou que não vem efetuando sua obrigação de pagar, é imediatamente estabelecido um crédito que deve ser pago quando houver a integral quitação da dívida.
Portanto, o dinheiro para suprir o caixa do condomínio não saiu do próprio condomínio, mas dos condôminos, o que impõe o caráter a esses valores de coisa alheia (objeto pertencente a terceiro). Desta forma, fica fácil entender que constitui crime contra o patrimônio a ação de vender, permutar, dar em pagamento, em locação ou em garantia, coisa alheia como própria, conforme o próprio tipo penal nos indica (ao menos em tese); vejamos o que diz o Código Penal Brasileiro, numa das formas de estelionato (artigo 171):
“Artigo 171 - Obter, para si ou para outrem, vantagem ilícita, em prejuízo alheio, induzindo ou mantendo alguém em erro, mediante artifício, ardil, ou qualquer outro meio fraudulento: Pena - reclusão, de um a cinco anos, e multa, de quinhentos mil réis a dez contos de réis.
§1°. - Se o criminoso é primário, e é de pequeno valor o prejuízo, o juiz pode aplicar a pena conforme o disposto no art. 155;
§2°. - Nas mesmas penas incorre quem: Dispondo de coisa alheia como própria;
I - vende, permuta, dá em pagamento, em locação ou em garantia coisa alheia como própria;”
O CCB mostra que o conjunto de suas disposições, como um sistema, obriga à essa situação, determinando aos condôminos pontuais pagarem os rateios não pagos e oriundos das unidades inadimplentes, tornando-se titulares do direito sobre o valor (que se constitui num verdadeiro empréstimo ao condomínio), cabendo ao síndico, como único representante legal do condomínio devolver esses valores, na mesma proporção do que foi pago por cada um, com juros e acréscimos legais. O síndico não pode fazer acordo para receber valor inferior ao devido sem a anuência de cada titular do direito (solução: assembleia), por lhe faltar poderes para decidir em nome dos terceiros credores.
E, se não for atualizada a quota mensal prevendo o acréscimo da inadimplência no procedimento de cobrança em juízo ou fora dele, ou ainda quando houver acordo para que o devedor inadimplente pague parcialmente o que deve, o valor a ser recebido será dividido somente entre os condôminos adimplentes que emprestaram os valores ao condomínio.
E, para que não existam dúvidas, ou contratempos, o valor total devido será detalhado, atualizado e deve figurar na ata assemblear, para que cada um dos condôminos possa ter ciência e possa exercer o respectivo direito de, em assembleia geral de condôminos, consumir as informações, tirar suas conclusões, após manifestar livremente seu entendimento, aceitando ou não o recebimento do valor total ou parcial daquilo que foi obrigado a pagar. Daí que o rateio do valor recebido do inadimplente, obrigatoriamente, deve respeitar a vontade de cada condômino, isoladamente, como titular individual do direito, sob pena do condomínio responder pela diferença.
Importante trazer à tona, o fato de que o condomínio, uma vez que realizou a assembleia geral de condôminos (artigo 1.350, CCB), palco onde ficou decidido e determinado que a arrecadação seria aquele valor mensal, não poderá reter os valores advindos de pagamento de despesas da unidade inadimplente, trazendo ao próprio caixa, ou ainda, pior, realizar qualquer obra, em virtude de que arrecadará valor maior do que a decisão assemblear decidiu. Se assim não fosse, aquele condômino inadimplente, ao realizar a quitação total ou parcial dos valores devidos, irá se beneficiar de modo indevido, porque pagou só o que devia, enquanto os outros condôminos pagaram, além da respectiva quota parte, mais a fração da quota parte não paga pela unidade inadimplente, trazendo a incidência do artigo 884, CCB, adiante mencionado:
“Artigo 884 - Aquele que, sem justa causa, se enriquecer à custa de outrem, será obrigado a restituir o indevidamente auferido, feita a atualização dos valores monetários.”
De posse dessas informações, o condômino credor tem a faculdade de poder decidir sobre o valor recebido, para dele dispor como quiser, podendo até mesmo receber sua respectiva quota parte em espécie, mediante recibo de quitação, o que o CCB permite (artigo 368):
“Artigo 368 - Se duas pessoas forem ao mesmo tempo credor e devedor uma da outra, as obrigações extinguem -se até onde se compensarem.”
Por fim, apesar de ser tema polêmico e complexo, é fácil entender que na ocasião em que o dinheiro do inadimplente retorna, ele entra no movimento ordinário do condomínio e é utilizado para pagar as despesas comuns ou para reposição do caixa e de fundos diversos (de reserva, de obras, de pintura etc), certo? Mas não pode, em vista das explanações anteriores, em razão de que o condomínio também beneficiará o inadimplente (porque o dinheiro que pagou ao condomínio o beneficiará numa redundância ilegal, e punindo o adimplente mais uma vez).
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